Sadomasoquismo

Dobrou os joelhos, caiu em oração. Os dedos do pé se amassaram com o peso dos calcanhares, sufocados. As palmas cruas apontaram aos céus, clamando pelo açoite, e a expressão desceu para baixo da linha dos ombros, lamentosa. Cabelos longos borravam seu rosto, e tampavam a total miragem do peito as coxas.
Em um golpe limpo,
atingi a nudez de sua mão com a chibata. A reação fora de um gemido prolongado.
Um suspiro quase de alívio, atrevido. Era nítido meu semblante estarrecido.
''Como pode alguém rebaixar-se a tão pouco?'', indaguei-me, no silêncio.
''Comparar-se a migalhas? Gozar da própria miséria?''.
Concluí então, que o que me tampava a essência do ato banal, era que a dor esvaía-se da carcaça com a tortura física. Na realidade, sequer era digno do nome de ato sádico. Havia um contrato silencioso entre as duas partes. Qualquer sicário, por mais tortuoso que fosse, jamais concluiria a misteriosa tarefa de levar aquela pobre criatura ao estado de agonia, sem antes provar do seu curioso segredo. Sua existência, quando despida dos caprichos de ter a sua pele rasgada, era por si só, intolerável. O pior castigo possível seria, por fim, privá-la da distração piedosa.
Soltei o relho,
dei as costas e o deixei
tão repentinamente
quanto surgi.
No caminho, pude ouvir
 seus gritos apavorados.
A cada passo dado, o chão
transbordava em lágrimas.
Satisfeito, sorri.
Pude destruí-la
com o silêncio,
faltando-nos o
consentimento,
então, desnecessário.

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